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Saúde sem dogma

Saúde sem dogma

Nas leituras de juventude (bem sei que já foi há 40 anos) impressionou-me bastante um livro de Sottomayor Cardia, com prefácio de Mário Soares — “Socialismo sem dogma” – do qual tenho um exemplar bastante anotado. A ortodoxia é sempre asfixiante, mas o autor tinha autoridade para dizer que “não pode dar-se à partida por adquirido que a apropriação dos meios de produção pelo Estado é mais favorável à justiça social – à igualdade de oportunidades e à solidariedade humana – do que a apropriação daqueles meios de produção por particulares”.

Agora que começa um novo ciclo legislativo é particularmente importante olhar para os caminhos de futuro e não posso deixar de relevar um estudo que o Conselho de Finanças Públicas divulgou no início do mês, cujo título é “O sistema de saúde português em perspetiva internacional: análise comparativa”. Vale muito a pena ler o documento porque tem informação objetiva, identifica bem os desafios que temos pela frente e faz uma série de recomendações fundamentadas e que merecem debate.

Para os autores do relatório é claro que “embora o sistema de saúde português assegure acesso universal, enfrenta uma crescente pressão, em grande parte devido ao envelhecimento da população, à escassez de camas e à falta de alguns profissionais de saúde”. Assim, é necessário adaptar o sistema de saúde às exigências atuais, “através da adoção de práticas inspiradas em modelos mais descentralizados e com maior envolvimento do setor privado, de forma a reforçar a sustentabilidade e assegurar elevados padrões de qualidade no atendimento.”

Com base na análise das soluções que diferentes países (Espanha, Alemanha, França, Reino Unido, Países Baixos, Suécia, Austrália e Israel) adotaram, e respetivos resultados, os autores entendem que, “para Portugal, a adoção de alguns elementos de outros sistemas como uma gestão mais descentralizada ou seguros de saúde obrigatórios, poderia ser uma solução para enfrentar desafios como os tempos de espera e a escassez de profissionais de saúde, sem comprometer os princípios de acesso universal e equidade que sustentam o sistema atual.”

Este exercício, que, como todos, deve ser escrutinado, torna muito claro quais são os objetivos que o sistema de saúde português deve seguir. Se realmente queremos ter “o doente no centro do sistema” e garantir que é dada resposta às preocupações da população, ao mesmo tempo que são antecipadas as necessidades crescentes de saúde, as reflexões dos especialistas do Conselho de Finanças Públicas oferecem à discussão uma série de opções.

Já em 1978 se defendia que o Estado deveria organizar um Serviço Nacional de Saúde, embora não devendo “arrogar-se um exclusivo no domínio da cobertura médico-sanitária” e justificava-se o regime de convenções com o privado “onde e quando ele revista natureza supletiva”. O objetivo político era a cobertura de cuidados de saúde, pelo que “a ideologização do processo apenas contribui para o prejudicar e atrasar, suscitando incompreensões, motivando solidariedades profissionais ou despertando expetativas impossíveis de satisfazer a curto e médio prazos”. O que era verdade então, é hoje atualíssimo.

O objetivo político em 2025 deve ser aumentar a cobertura de cuidados de saúde (menos listas de espera, inovação terapêutica, continuidade de cuidados). Sem dogma. Os portugueses necessitam desta segurança e os escassos recursos do país e os seus desafios (demografia, escassez de profissionais, transição digital, sustentabilidade) exigem-no.

observador

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