O objetivo da ciência não é falar com todos, mas falar honestamente com aqueles que querem ouvir.


Lidar
Maus cientistas
Tentar dialogar com aqueles que rejeitam o método científico por princípio é inútil, pois essa rejeição afeta a própria ideia de verificação. Mas isso não significa que devamos parar de disseminar informações. Como Piero Angela foi um dos primeiros a demonstrar, existe um segmento de cidadãos curiosos e atentos.
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"Discutam isso entre vocês, cientistas", "não adianta ficar discutindo detalhes", "a maioria dos leitores nunca vai entender essas coisas mesmo". Essas são frases que ouvimos com frequência quando um pesquisador ou comunicador científico tenta explicar os aspectos mais delicados de um resultado científico ao público: por exemplo, como fiz ontem , a extensão da incerteza, o grau de confiabilidade dos dados, a lógica por trás de uma conclusão. À primeira vista, parecem observações de senso comum. Nem todos têm formação técnica, e discutir números, margens ou probabilidades pode parecer um exercício para especialistas. Na realidade, essa crença — de que o público deve ser protegido da complexidade — acredito ser a principal causa da lacuna entre a ciência e a sociedade. Deixe-me esclarecer: não tenho a formação profissional que bons comunicadores científicos possuem e falo apenas a partir da minha limitada experiência direta, resultante dos meus esforços para comunicar ao público, e muitas vezes também para melhor compreendê-lo junto com o público, algum fato científico que considero relevante. No entanto, acredito que, tendo recebido frequentemente comentários como os apresentados no início deste breve artigo, talvez seja pertinente explicar minha posição sobre o assunto, a título de resposta.
Acredito que a confiança na informação científica não surge de mensagens simplificadas, mas da capacidade de acompanhar um raciocínio passo a passo e sua precisão. Quando a comunicação reduz tudo a fórmulas curtas — "a vacina funciona" ou "não funciona", "é segura" ou "não é segura" — produz informações frágeis, prontas para ruir à primeira atualização dos dados. É claro que essa comunicação cumpre uma função social muito útil, especialmente em uma emergência, que é fornecer orientação especializada àqueles que optaram por confiar nos especialistas; no entanto, não é esse o meu objetivo ao comunicar resultados científicos. Explicar as condições e limitações desse resultado, porém, permite-nos compreender a sua solidez e aceitar que ele pode ser revisto sem que isso diminua a sua credibilidade. O conhecimento científico é um sistema dinâmico: aprimora-se ao medir os seus próprios limites, e essa capacidade de autoverificação é o que o torna confiável. Não acredito que a comunicação científica possa ser feita sem levar isso em consideração constantemente e refletir esses conceitos nas palavras. Além disso, acredito que uma boa divulgação não serve primordialmente para persuadir, mas sim para tornar visível como a ciência constrói e controla seus resultados, e como e por que certas ideias estão erradas.
"Claro, mas vá explicar essas coisas aos antivacinas", diria meu oponente. Não a eles, respondo. Todos sabemos que tentar dialogar com aqueles que rejeitam o método científico por princípio é inútil, porque a rejeição deles não se refere ao conteúdo, mas à própria ideia de verificação. Um antivacina ou um teórico da conspiração está defendendo uma identidade, não um argumento: para eles, a discussão racional é apenas uma oportunidade de reafirmar sua filiação. Nesses casos, no máximo, trata-se de impedir que o discurso público perca seus critérios de coerência. Revelar informações a um antivacina é, portanto, simplesmente inútil, mas o fato de ser inútil para eles não significa que devamos parar de disseminar informações.
Além disso, mesmo na ausência de interlocutores dispostos a compreender, por vezes é necessário responder. Fazer isso serve não tanto para mudar a opinião daqueles que espalham falsidades, mas sim para proteger aqueles que observam. Quando frases como "vacinas modificam o DNA" ou "empresas farmacêuticas escondem efeitos colaterais" circulam, um esclarecimento público fornece contexto, fontes e verificação. O mesmo se aplica a vídeos que manipulam gráficos ou curvas de contágio para inventar correlações inexistentes: explicar onde e como a distorção ocorre ajuda a restabelecer as regras da discussão racional. Desta perspectiva, mesmo o "método Burioni" — respostas curtas, irônicas, por vezes incisivas, insultuosas e irritantes, mas sempre fundamentadas em dados verificáveis — tinha e tem uma função específica: não converter negacionistas ou explicar, mas apontar que existe um limite além do qual a discussão deixa de ser razoável, sem, de fato, desperdiçar divulgação com aqueles que talvez nunca estejam verdadeiramente interessados. Creio que é aqui que surge a questão central: aqueles que comunicam ciência devem saber a quem se dirigem. Não existe um público único e indiferenciado.
Como Piero Angela foi um dos primeiros a demonstrar, existe um segmento de cidadãos curiosos, atentos, dispostos a se concentrar e a fazer um pequeno esforço para compreender. É a eles que a divulgação deve ser direcionada. São pessoas que querem conhecer os resultados obtidos, entender os processos, ver como o conhecimento é construído e refinado e compreender por que um resultado só tem valor se o método que o produziu for transparente. Essas pessoas não necessariamente já possuem uma ideia clara sobre o assunto; aliás, muitas vezes estão interessadas em avaliar os diversos argumentos, para então decidir qual é o mais convincente. É a elas que vale a pena dedicar tempo, rigor e clareza, demonstrando a força do método: somente nessa troca o conhecimento pode circular de forma autêntica.
Existe ainda um segmento de oponentes do discurso científico e da própria ciência, que neste período histórico conseguiram inclusive levar ao poder figuras como Robert Kennedy Jr. , inundando sistematicamente os jornais com mentiras, atacando e insultando para defender mentiras absurdas que, no entanto, servem para fortalecer seu próprio grupo (e beneficiar aqueles que as inventam para extorquir dinheiro). Com essas pessoas, não há espaço para disseminação ou discussão de dados ; enquanto houver paciência e força, devem ser denunciadas, desmascaradas e expostas ao público (ou às autoridades policiais, se for o caso), sem muita preocupação com a polarização resultante, pois, na verdade, suas ideias já são polarizadoras, e já foi demonstrado inúmeras vezes o que acontece quando são deixadas à solta.
Em última análise, acredito que o objetivo não é "falar com todos", mas sim falar honestamente com aqueles que estão dispostos a ouvir. A comunicação concebida para agradar a todos acaba se assemelhando à publicidade ou a um espetáculo: imediata, emocional, reconfortante e sem substância. A ciência exige um ritmo diferente: atenção, paciência e envolvimento cognitivo de ambos os lados. Quem comunica deve evitar jargões sem sacrificar o rigor e, acima de tudo, deve demonstrar a máxima honestidade em seu raciocínio e na apresentação de fatos e dados; quem ouve deve aceitar que a compreensão requer tempo, precisão e alguma dificuldade. Os papéis não são rígidos: às vezes, nosso interlocutor sabe mais ou descobre uma falha no próprio raciocínio que estávamos usando, mas, como compartilhamos um método comum, é mais fácil resolver conflitos de interpretação. Desse equilíbrio nasce a confiança.
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