Frágeis fundações – Frágil primeiro-ministro

Escrevo estas linhas no dia em que Portugal está chocado e de luto com as consequências do terrível e trágico acidente que atingiu o Elevador da Glória. As consequências para a imagem de Lisboa e do país são certamente significativas, mas acima de tudo, colocam em causa a qualidade de gestão, política e técnica, dos responsáveis diretos e indiretos pela gestão da Carris. Num país onde por hábito a culpa política morre solteira, lembro-me sempre, em situações terríveis como esta, de Jorge Coelho e da sua atitude aquando do horrendo acidente que provocou a tragédia da queda da Ponte de Entre os Rios em 2001. Jorge Coelho, então ministro do Equipamento Social, apresentou a sua demissão. E para quem tenha a tentação de me acusar de ser socialista, fica a nota de que sou militante de base do PSD.
Contudo este artigo tem por objetivo não tanto abordar questões de ética na política, mas acima de tudo de competência, ou a bem dizer da generalizada falta dela na política. Quando aponto à generalizada falta de preparação dos políticos, tenho indicado como causas principais o modelo profundamente fechado e nada meritocrático no modo como os partidos políticos funcionam e a parca remuneração dos cargos eleitos. Estas condições afastam, indubitavelmente, uma parte significativa de cidadãos, bem preparados para gerir causas e políticas públicas da participação na política ativa. São condicionantes fortes, injustas, pouco democráticas, protecionistas e pouco amigas da competência. Contudo não são suficientes para explicar tanta falta de destreza na gestão de causas, organizações e políticas públicas.
Recentemente apontei a fragilidade da escola onde Luís Montenegro obteve a licenciatura (polo do Porto da Faculdade de Direito da UCP) por verificar que os requisitos de entrada nessa faculdade são surpreendentemente básicos. Com uma nota mínima nas provas de ingresso de 9,5 valores e uma nota mínima de candidatura de 10 valores, está abaixo das condições que considero aceitáveis. Na mesma universidade em Lisboa o curso de gestão impôs como regra de entrada nota mínima de candidatura de 14 valores. As limitações e incapacidades de gestão que o primeiro-ministro apresenta têm origem profunda no trajeto sem grande substância que caracterizam a sua formação e o seu percurso. Não tem nem a formação nem as características para gerir a complexidade do entrave que Portugal carrega em si.
Grave é que Luís Montenegro é oriundo de um sistema que facilita o branqueamento da falta de competência, trabalho e conquistas relevantes. Nos partidos políticos, mas também numa crescente falta de rigor no que à frequência da universidade diz respeito.
As universidades deveriam, em tese, ter um papel de identificação e promoção de talento, nomeadamente num país com uma economia fragilizada como a portuguesa, e num contexto duma enorme falta de recursos humanos em tarefas híper importantes, mas pouco atrativas e para as quais os cursos técnicos não são suficientemente credibilizados nem socialmente reconhecidos. Uma das causas para a tão polémica emigração crescente.
Deixo aqui um conjunto de dados que nos deveriam incentivar a uma reflexão estratégica quanto ao rumo que pretendemos para Portugal. Das 1099 licenciaturas com vagas abertas no Concurso Nacional de Acesso 2025/2026, 821 (cerca de 75%) apresentam nota mínima de ingresso abaixo dos 15 valores e mais de 60% abaixo dos 14 valores, havendo mesmo alunos que entraram com nota de 9,55. Ou seja, a maior parte das licenciaturas é frequentada por alunos com notas de ingresso relativamente abaixo daquilo que um critério mais exigente do ponto de vista da meritocracia e competência justificaria. Pessoalmente considero que não deveria ser permitida a entrada em cursos superiores, nas universidades pÚblicas e privadas em Portugal, com notas de ingresso inferiores a 14 valores. Enquanto considerarmos que a competência e a meritocracia não constituem filtros indispensáveis no acesso à responsabilidade política, continuaremos bem-falantes estagnados.
CEO do Taguspark, Professor universitário
Jornal Sol